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Inovação, Patentes e Informações Tecnológicas

1 de fevereiro de 2018

Felipe Monteiro

Por Henry Suzuki 

Superar as dificuldades para depositar uma patente é um grande desafio, mas com orientação e esforço qualquer um pode encontrar os caminhos para garantir a proteção das suas criações. Neste breve artigo, procurarei abordar aspectos que vão um pouco além de questões técnicas e que são uma espécie de coletânea de recomendações práticas, fruto de conversas com mentorados, mentores e especialistas ao longo dos últimos ciclos do InovAtiva. O título deste breve artigo se baseia em workshop quase homônimo que tenho ministrado por todo o país, cujo conteúdo técnico pode ser acessado nos vídeos nesse link nesse outro link.

Existem vários instrumentos de apropriação intelectual. É importante conhecer todos

Comumente, as pessoas se lembram de marcas e patentes quando ouvem falar de propriedade intelectual. Além desses existem vários outros mecanismos de apropriação, tais como segredos industriais, designs, cultivares, direitos autorais, registro de software, indicações geográficas, topografia de circuitos integrados, etc. Um ótimo texto que versa sobre vários desses instrumentos é a Cartilha da Propriedade Intelectual, editada pela OAB-RS em 2015: Como dizem: vivemos na “Era do Conhecimento”. Saber como se apropriar de ativos intelectuais é essencial para qualquer pessoa ou empresa que queira ter sucesso.

Diferentes instrumentos de apropriação têm diferentes lógicas de uso. O melhor é usar vários em combinação

Especialmente entre startups na área de tecnologia, há uma crença que o registro de software é a melhor alternativa de proteção. Não que o registro de software não seja importante (embora não seja obrigatório para que se tenha direito), mas, na maior parte dos casos o registro de software em si (que serve muito mais para o criador se defender no caso de ser acusado de ter copiado as linhas de programação que ele mesmo criou ou então para evitar cópias descaradamente pirateadas de suas linhas de programação) não é suficiente para evitar que terceiros, por exemplo, desenvolvam softwares que tenham a mesma funcionalidade (e que talvez pudessem ser protegidos por patentes de invenções implementadas por programas de computador). Em outras situações, o uso de direitos autorais para a proteção de layouts criativos de telas de aplicativos pode ser particularmente útil. O uso combinado e consciente e de vários instrumentos de apropriação é importante para construção de boas estratégias de proteção.

Diferentes instrumentos de apropriação têm diferentes coberturas geográficas e temporais

Apenas para usar como exemplo: direitos autorais materiais sobre a reprodução de obras literárias, artísticas, científicas, etc. não dependem de registro formal, são internacionais e têm um prazo de vigência extremamente longo: 70 anos após 1º de janeiro subsequente à morte do último coautor. No caso das linhas de programação de softwares, que também independem de registro formal e são internacionais, o prazo é de 50 anos após 1º de janeiro subsequente à sua publicação ou, na ausência desta, da sua criação. Já patentes, por exemplo, dependem de depósitos formais, são nacionais (existe até tramitação regional, por exemplo, na Comunidade Europeia, mas mesmo lá ainda não existe patente comunitária) e têm tempo de vigência bem mais curto (no Brasil: 20 anos após o depósito ou pelo menos 10 anos após a concessão, no caso de patente de invenção. 15 anos após o depósito ou pelo menos 7 anos após a concessão). Já para desenhos industriais, por exemplo, existe a possibilidade de registro com abrangência em toda a Comunidade Europeia, e assim por diante…

Patentear em muitos países pode custar uma verdadeira fortuna. Patentear só no Brasil, às vezes é decretar óbito do projeto

As taxas para depósito de patente no Brasil para pessoas físicas é de apenas BRL 70. Para depositar um pedido PCT (e com isso ganhar um pouco mais de prazo para entrar em fase nacional em outros países) o custo será de cerca de BRL 3500 a 5000. Já para entrar em fase nacional (traduzir, pagar taxas e contratar um procurador) o custo pode ser de cerca de USD 3000 a 5000 por país, dependendo do tamanho da patente. Isso sem falar nos custos de tramitação, etc. Por outro lado, depositar só no Brasil pode acabar inviabilizando o projeto. Assim, nos casos em que a proteção por patentes em vários países for essencial (como é o caso de alguns segmentos tecnológicos como o farmacêutico, por exemplo) é importantíssimo saber se haverá dinheiro em caixa para fazer esses pagamentos ou até mesmo ter investidores especificamente para cobrir tais despesas.

Ao invés de contratar alguém para redigir uma patente, aprenda como fazê-lo e contrate alguém para orientar e revisar a redação

Há quem diga que uma patente com um quadro reivindicatório bem construído e embasado seja um dos textos tecnicamente mais complexos que exista. Por conta disso e por conta do “patentês” ser uma linguagem aparentemente indigesta à primeira vista, muitos correm para contratar um especialista para redigir uma patente. Pior do que isso, fazem a cotação do serviço ao estilo “porteira fechada”. Costumo dizer que pedir para alguém orçar a redação de uma patente é semelhante a orçar a construção de uma casa sem informar qual é a planta. Ou seja: é virtualmente impossível saber de antemão. O processo envolve buscas de publicações, leitura crítica, seleção de anterioridades, identificação de problemas técnicos e soluções semelhantes que já existam, etc. E o pior é que a hora técnica dos tais especialistas em redação é bem cara: algo em torno de BRL 250 a 500 a hora. E tudo começa com o inventor tendo que contar para o redator o que é sua invenção. Após 4 horas ensinando o seu redator, abra a carteira e pague pelo menos uns BRL 1000. Não parece melhor contratar alguém para te ensinar e revisar? 4 horas orientação e revisão são bastante tempo e retiram do seu prestador de serviços a responsabilidade de ter que fazer longos e minuciosos estudos. Se alguém precisa conhecer bem a sua tecnologia, as anterioridades, os concorrentes, etc. este alguém é você ou alguém da sua equipe interna. Assim, o conhecimento gerado com os estudos ficará com você. Nada contra os especialistas, muito pelo contrário, mas é importante saber quando e como recorrer a eles.

Pior que não conseguir patentear é não poder colocar no mercado, por estar infringindo patentes de terceiros

Geralmente, as pessoas se lembram de patentes quando acham que inventaram alguma coisa bacana, mas se esquecem que os outros também estão inventando e depositando patentes. O grande problema é que, em relação a patentes o fato de você ter uma patente concedida não significa que você mesmo pode colocar sua invenção no mercado. Caso um terceiro tenha uma patente que confira proteção a um ou mais componentes da sua invenção, ele poderá te impedir de produzir, usar, colocar a venda, etc. aquele componente que está coberto pela patente dele e, com isso, inviabilizar que você explore sua própria invenção. É fato que existe a figura do licenciamento compulsório no caso de patentes dependentes no Brasil, mas mesmo neste caso, há a subjetividade na definição do que poderia ser considerado “substancial progresso técnico” em relação ao objeto da patente anterior, entre outras coisas mais. Assim, antes de iniciar um novo projeto é prudente que o time conheça bem o cenário patentário sob risco de “entrar em um campo minado de olhos vendados”. No jargão da indústria, isso compreende os chamados “estudos de liberdade de operação”, mas não para por aí.

Além de serem instrumentos para impedirem terceiros explorarem invenções, patentes são fontes de informações

Um dos requisitos para que uma patente seja concedida é que, além de reivindicar uma invenção patenteável, seu relatório deve “descrever clara e suficientemente o objeto (da invenção), de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto e indicar, quando for o caso, a melhor forma de execução. Assim, não por acaso, patentes podem ter dezenas de páginas descrevendo o produto ou tecnologia que objetivam proteger. Além do conteúdo do texto da patente, outras informações complementares podem ser extraídas ao longo de sua tramitação, como por exemplo: cotitulares, inventores, cobertura geográfica, citações, dados de litígio, etc. A análise conjunta de conjuntos de patentes pode revelar informações interessantes sobre os principais jogadores do mercado, seus portfólios, parcerias, fusões, aquisições entre outras coisas mais. Algo como se olhar para a floresta e não apenas para as árvores de forma individual. Muitos produtos e tecnologias escritos em patentes podem estar livres para exploração, seja por que já expiraram ou por que não foram objeto de proteção em determinados países. Importante lembrar que uma boa parte de informações sobre produtos e tecnologias ublicados em patentes não são publicados em qualquer outro tipo de fonte (por exemplo, na área de embalagens, não existe nenhum “journal of bottle caps”. Neste ponto (e em associação com o item 6 acima), costumo dizer que um empresário ou investidor até pode preferir não depositar patentes, mas não pode ser dar o luxo de não conhecer patentes de terceiros ou então tecnologias que estejam “dando sopa” para serem copiadas onde não estiverem protegidas.

Nestes sete itens, pudemos ver um pouco mais sobre aspectos práticos sobre patentes e instrumentos de apropriação intelectual. Poderíamos avançar por dezenas de páginas, mas ficaria cansativo e nunca esgotaria o tema. Para finalizar este texto, algumas das mensagens adicionais/complementares que eu gostaria que ficassem registradas são:

  1. Na “Era do Conhecimento”, aprenda as regras do jogo da propriedade intelectual
  2. Tome cuidado para não terceirizar demais. Faça você mesmo até onde puder
  3. Esteja atento aos direitos de terceiros te impedirem
  4. Não dê mole para a concorrência (proteja suas criações)
  5. Utilize informações publicadas em patentes, desenhos industriais, marcas, etc.

*Henry Suzuki é empresário e inventor.